Taxa de suicídio entre jovens cresce 30% em 25 anos no Brasil
Iara
Biderman – de São Paulo
É uma das primeiras causas de
morte em homens jovens nos países desenvolvidos e emergentes. Mata 26
brasileiros por dia. E ninguém quer falar no assunto.
No Brasil, a taxa de suicídio
entre adolescentes e jovens aumentou pelo menos 30% nos últimos 25 anos. O
crescimento é maior do que o da média da população, segundo o psiquiatra José
Manoel Bertolote, autor de "O Suicídio e sua Prevenção" (ed. Unesp,
142 págs., R$ 18).
A curva ascendente vai contra
a tendência observada em países da Europa ocidental, nos Estados Unidos, na
China e na Austrália. Nesses lugares, o número de jovens suicidas vem caindo,
ao contrário do que acontece no Brasil, aponta um estudo da University College
London publicado no periódico "Lancet" no ano passado.
"Na década de 1990, a
taxa de suicídios aumentava em todos os países do mundo, e a OMS [Organização
Mundial da Saúde] lançou um programa de prevenção. Os países que fizeram campanhas
de esclarecimento conseguiram baixar os números. É importante falar do
assunto", diz o psiquiatra Neury Botega, da Unicamp.
TABU
O tema é tabu até para
profissionais de saúde. Nos registros do Datasus (banco de dados do Sistema
Único de Saúde), aparece como "mortes por lesões autoprovocadas
voluntariamente". Um longo eufemismo, segundo Botega. Evita-se a palavra,
mas o problema se perpetua.
Em cursos de prevenção, o
psiquiatra registrou as crenças de profissionais de saúde. Muitos acham que
perguntar à pessoa se ela pensa em se matar já pode induzi-la a consumar o ato.
Cena do documentário
'Elena', de Petra Costa (foto); diretora refaz trajetória da irmã, que se
matou em 1990, aos 20 anos
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"Não temos esse poder de
inocular a ideia na pessoa. E, se não tentarmos saber o que ela está pensando
sobre o assunto, não conseguiremos ajudá-la", diz o psiquiatra.
A taxa cresce por uma
conjugação de fatores. "A sociedade está cada vez menos solidária, o jovem
não tem mais uma rede de apoio. Além disso, é desiludido em relação aos ideais
que outras gerações tiveram", diz Neury.
Há ainda uma pressão social
para ser feliz, principalmente nas redes sociais. "Todo mundo tem que se
sentir ótimo. A obrigação de ser feliz gera tensão no jovem", diz Robert
Gellert Paris, diretor da Associação pela Saúde Emocional de Crianças e
conselheiro do CVV (Centro de Valorização da Vida).
O aumento de casos de
depressão em crianças e adolescentes é outro componente importante. "Mais
de 95% das pessoas que se suicidam têm diagnóstico de doença
psiquiátrica", diz Bertolote.
Junte-se tudo isso ao maior
consumo de álcool e drogas e a bomba está armada.
"ELENA"
A cineasta e atriz mineira
Petra Costa tinha sete anos quando a irmã mais velha se suicidou. Mais de 20
anos depois, Petra dirigiu o documentário "Elena", atualmente em
cartaz, em que tenta entender e comunicar o que a irmã pensava e sentia.
"As pessoas têm
dificuldade de falar e de ouvir sobre o assunto. A sociedade brasileira tem que
aprender a conversar sobre suicídio, porque o número de casos só aumenta",
diz Petra.
Falar de suicídio nunca foi
tabu para a diretora. "Desde que eu tinha sete anos, quando Elena se
suicidou, minha mãe conversava comigo sobre isso, nunca me escondeu nada",
conta.
Mas ela logo percebeu que,
fora de casa, o tema era proibido. "A primeira vez que falei do assunto
com outras famílias que passaram por isso foi aos 27 anos, quando procurei
grupos de parentes de suicidas. Então me senti compreendida em minha dor."
Petra conta que, logo após a
morte de Elena, sua mãe procurou pessoas próximas de alguém que havia se
matado. Mas todos se recusaram a conversar com ela.
Ela também lamenta que, à
época do suicídio da irmã, as pessoas ao seu redor não tivessem informações
sobre o assunto nem soubessem como falar sobre ele.
"O mais lastimável em
relação à Elena é que, nos anos 1990, no grupo de pessoas com quem ela
convivia, sabia-se pouco sobre bipolaridade, depressão, suicídio. A
desinformação levou à tragédia", afirma Petra.
A cineasta tem interesse nessa
causa. A produtora do filme, Busca Vida, está organizando debates sobre o tema.
E Petra planeja criar o Instituto Elena, para prevenção de suicídios.
PREVENÇÃO
A troca de informações sobre o
suicídio pode evitar muitos casos: de acordo com a OMS, dá para prevenir 90%
das mortes se houver condições para oferta da ajuda.
Quem pensa em suicídio está
passando por um sofrimento psicológico e não vê como sair disso. Mas não
significa que queira morrer.
"O sentimento é
ambivalente: a pessoa quer se livrar da dor, mas quer viver. Por dentro, vira
uma panela de pressão. Se ela puder falar e ser ouvida, além de diminuir a
pressão interna, passa a se entender melhor", diz Paris.
O CVV oferece apoio 24 horas
pelo telefone 141 e pelo site www.cvv.org.br.
Fonte:http://www1.folha.uol.com.br
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