Desejo sexual: você "pega
no tranco"?
Por Ailton Amélio
Creio que todo mundo já teve a experiência ou já
viu alguém fazer um carro pegar no tranco. Acontece assim: quando acaba a
bateria, o motorista não consegue fazê-lo pegar acionando a chave de ignição.
Neste caso, o motorista pode tentar fazê-lo pegar no tranco: coloca a segunda
marcha, pisa na embreagem e pede para outras pessoas o empurrarem ou,
quando ele está em uma descida, libera o freio de mão para permitir que ele
comece a se movimentar ladeira abaixo. Quando o carro ganha uma boa velocidade,
o condutor abruptamente tira o pé da embreagem. O carro dá um tranco e, com
alguma sorte, passa a funcionar normalmente.
No sexo acontece
algo semelhante: muita gente não sente desejo pelo parceiro. Essa falta de
desejo pode ser circunstancial (de vez em quando acontece com todo mundo) ou
crônica (nunca sente desejo por este parceiro). Sem desejo não dá para fazer
sexo, ou pelo menos, não dá para fazer um bom sexo. Para fazer um bom sexo é
necessária a excitação (por exemplo, a ereção do pênis e a lubrificação,
intumescimento, alargamento e alongamento do canal vaginal). O principal
disparador da excitação é o desejo.
Pois bem, quando o
desejo pelo parceiro está fraco (a bateria está fraca demais para acionar a partida), é possível usar alguns artifícios para estimulá-lo e, em seguida,
tentar dar a partida. Dada a partida, o sexo pode passar a funcionar de forma
semelhante ao iniciado pelo desejo pelo parceiro.
O desejo produzido
pela possibilidade de sexo com uma pessoa atraente e o desejo produzido pela
estimulação de zonas erógenas podem ser comparados, respectivamente, com o riso
que é provocado por coisas engraçadas e pelo riso provocado por cócegas.
Geralmente gostamos de rir de coisas engraçadas, mas pouca gente gosta de rir
quando alguém lhe faz cócegas e pede para que esta pessoa continue a fazê-lo.
Este é o assunto
que vamos examinar neste artigo.
Sarah não tinha desejo, mas acabava ficando
excitada durante o sexo
Sarah havia
perdido o desejo sexual pelo marido. Ele não a tratava bem, não era nada
romântico e só apresentava um arremedo de carinho quando queria sexo. “Na cama,
ele era como um galo: montou, arremeteu algumas vezes, ejaculou e encerrou. Em
seguida, virava para o outro lado e dormia como um porco.”
Sempre que ele
apresentava sinais que queria transar, ela dava todos os tipos de desculpas:
dor de cabeça, indisposição, cansaço, noite de lua cheia, etc. No entanto, como
ela ainda não havia decidido a encarar uma separação, continuava a transar com
ele de vez em quando, para não azedar de vez o ambiente familiar.
Nesses raros
episódios sexuais, na hora que ia para a cama com o marido, ela geralmente não
estava sentindo desejo e, muito menos, excitação. Pelo contrário, sentia-se
obrigada a fazer algo que era desagradável e humilhante. Por isso, no início
desses episódios sexuais, ela não estava lubrificada e a musculatura da sua
vagina não estava relaxada. Como consequência, as primeiras penetrações
geralmente doíam e eram muito desagradáveis.
Ela, no entanto,
disfarçava a ausência de desejo e de excitação e os sentimentos desagradáveis e
simulava certo grau de prazer e desejo. Se mostrasse que estava fazendo esforço
e que não sentia nenhum desejo pelo marido ou que estava usando artifícios para
se excitar, isso certamente geraria uma grande encrenca com ele.
No entanto, após
iniciar as práticas sexuais, ela passava a sentir desejo, se excitava e quase
sempre tinha um orgasmo. Dentre as práticas que despertavam o seu desejo, a
mais eficiente era receber sexo oral. Também ajudava muito quando ela imaginava
que estava transando com outra pessoa.
A qualidade do
desejo é diferente
O desejo de Sarah,
quando pegava no tranco, não tinha a mesma qualidade e não era, de forma
alguma, um bom substituto para o seu desejo “normal”, aquele, por exemplo, que
ela sentia por outros homens. Este último tipo de desejo aparecia
espontaneamente muito antes do início de qualquer prática sexual e era
despertado pela masculinidade, sensualidade e atitudes positivas desses homens
desejáveis. Sarah tinha muitos pensamentos persistentes e fantasias com homens
assim. Frequentemente ela se masturbava pensando em algum homem conhecido que
tinha essas características. O desejo despertado pelas práticas sexuais com o
marido era produzido principalmente pela estimulação de suas zonas erógenas e
pelos longos períodos de privação sexual que ela havia passando desde o último
encontro. O desejo provocado no tranco e o sexo que vinha com ele deixava um
sabor amargo posterior e uma necessidade de evitar ou adiar o máximo possível o
próximo episódio sexual com o marido.
Após “cumprir a
missão” ela se sentia frustrada, vazia e usada. Esses sentimentos negativos
estavam produzindo efeitos cumulativos: cada episódio sexual era pior do que o
anterior. A única coisa boa é que após cada um deles, ela podia passar algum
tempo sem transar de novo com o marido.
Podia ser pior:
nem no tranco
Sarah ainda se
achava uma mulher de sorte quando se comparava com certas amigas. Estas não
conseguiam pegar no tranco e, por isso, não conseguiam sentir nenhum prazer
durante o sexo. Só ficavam no desprazer. Essas amigas podiam contar nos dedos
de uma mão a quantidade de vezes que tiveram orgasmo com seus companheiros! (A
maior parte das mulheres que não consegue orgasmo com o marido, consegue chegar
lá quando se masturba. Isso indica que elas não têm problemas orgânicos que
impedem o orgasmo. Uma boa ajuda psicológica é altamente recomendada para
resolver este tipo de problema).
Artifícios usados por Jair para conseguir transar
com a esposa
O desejo de Jair
pela sua esposa quase havia desaparecido. Há muito tempo, aquele desejo
inicial, que era alimentado pela novidade, havia perdido o brilho. Isso é
inevitável em qualquer relacionamento duradouro. No entanto, o sexo com ela
também havia se tornado desestimulante em outros sentidos, que poderiam ter
sido evitados.
Atualmente o
tipo de sexo que ela topava fazer era básico, monótono e cheio de “Isso não!”.
Com o passar dos anos, ela havia descuidado da sua forma física e, por isso, a
sua aparência atual estava muito longe daquela que ela tinha na época que
haviam se conhecido e que se manteve durante os primeiros anos de casamento,
antes da sua primeira gravidez.
O pior de tudo é
que os hormônios sexuais de Jair já estavam um tanto escassos e, por isso
mesmo, logo agora que ele precisava de mais estimulação por parte da mulher é
que ela havia se tornado insípida, pouco atraente aos olhos e muito
desagradável aos ouvidos!
Embora não tivesse
desejo pela esposa, Jair sabia que de tempos em tempos tinha que “comparecer”.
Não estava nos seus planos terminar o casamento e nem ficar ouvindo reclamações
da mulher pela sua ausência sexual. Ao que tudo indica, ela reclamava e exigia
sexo não porque tivesse um grande desejo sexual, mas sim, porque a ausência de
sexo fazia com que ela se sentisse não desejável (adeus autoestima!) e porque
ela temia que Jair acabasse se envolvendo com outras mulheres, caso não
satisfizesse suas necessidades sexuais com ela.
Para dar conta do
recado, Jair lançava mão dos seguintes artifícios: (1) evitava a masturbação
para aumentar a sua necessidade biológica de sexo, (2) pensava em outra mulher
enquanto transava com a sua esposa, (3) logo antes de procura-la para sexo,
assistia algum filme pornô no computador para ficar excitado e (4) tomava um
remédio ajudar a ter e a manter uma boa ereção. Após tomar algumas ou todas
essas medidas, ele conseguia começar a “funcionar”. Após iniciar o sexo com a
esposa, ai sim, as fricções e a sua fantasia com outra mulher eram suficientes
para que ele conseguisse levar a cabo a sua “missão”. Feito isso, agora sim,
poderia ter um tempo de folga até que o dever voltasse a bater na sua porta!
Quando
“comparecia”, Jair estava mais movido pela cobrança e pelas necessidades
biológicas do que pela atração pela mulher. Ele estava sempre procurando
introduzir “brinquedinhos eróticos” e filmes pornôs no sexo com a mulher, para
ver se isso melhorava a sua excitação. Ela não mostra nenhum entusiasmo por
essas “práticas alternativas”. Quando ele fazia uso desses artifícios, ela
sentia que o desejo de Jair não era por ela, mas sim pelos filmes e brinquedos.
Este tipo de sexo
com “aditivos”, ao invés de aproximar os cônjuges estava afastando-os. Além de
achar que o uso desses aditivos era uma espécie de depravação, ela temia que
esse uso pudesse “viciá-los de tal forma que só passassem a sentir desejo e
ficarem excitados quando houve algum estimulante deste tipo”.
O desejo é a primeira fase de um episódio sexual
satisfatório
Um episódio sexual
bem sucedido pode ser dividido em quatro fases: desejo (fantasias acerca da
atividade sexual e desejo de praticar a atividade sexual), excitação
(sentimento de prazer e alterações fisiológicas concomitantes. Inclui, por
exemplo, a ereção peniana do homem e a lubrificação e a expansão vaginal da
mulher), orgasmo (clímax sexual, com liberação da tensão sexual e contração
rítmica dos músculos do períneo) e resolução (sensação de relaxamento muscular
e bem-estar geral) (Manual de Diagnóstico Estatístico de Transtornos Sexuais –
4a. Edição, pp. 467 - 468).
O desejo sexual
feminino
O desejo sexual
feminino depende um conjunto de fatores que vai muito além das dosagens
hormonais, das características físicas do parceiro e das suas habilidades na
área sexual. Geralmente o desejo da mulher também é afetado pela qualidade do
relacionamento que existe entre ela e os companheiro em todas situações.
Por exemplo, quando o companheiro não é atencioso, respeitoso, romântico e
viril durante boa parte do tempo, elas esfriam. Não adianta ficar romântico e
carinhoso só quando quer sexo. Adianta menos ainda tentar apimentar diretamente
as práticas sexuais.
Pouco desejo
sexual
A insuficiência de
desejo sexual pode ser uma característica crônica e abrangente ou específica e
aparecer apenas circunstancialmente. Quando é crônica e abrangente, ela está
presente há muito tempo, acontece com todos os possíveis parceiros e há
poucas fantasias e sonhos eróticos. Quando ela é específica e circunstancial,
aparece apenas em certas situações (por exemplo, quando o parceiro agiu de uma
forma desrespeitosa) ou com certas pessoas. Neste último caso, a falta de
desejo é natural e muito útil para selecionar parceiros amorosos – só devemos
iniciar ou manter um relacionamento amoroso com alguém que desperte em nós
alguma atração sexual ou que, pelo menos, tenha potencial para isso.
A diminuição do
desejo pode ocorrer durante um relacionamento amoroso que está em curso. Quando
esta diminuição é acentuada e perdura por muito tempo, existe uma grande chance
de o relacionamento se deteriorar.
Problemas no
desejo sexual? Procure a ajuda de um psicólogo.
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e-mail: ailtonamelio@uol.com.br
Fonte:
http://ailtonamelio.blog.uol.com.br/