Somos
poliamorosos, polissexuais e megainibidos
O casamento
monogâmico exige que tenhamos amor romântico, relações sexuais e vários tipos
de compromissos apenas com o nosso cônjuge. Existem algumas tendências
biológicas, sociais e pessoais que favorecem essa forma de casamento. Por outro
lado, também existem várias tendências que favorecem a poligamia ou a anogamia
(ausência de qualquer tipo de casamento e a expressão livre do amor e da
sexualidade). Vamos destacar aqui duas dessas últimas tendências: o poliamor e
o polissexo.
As
sociedades que têm monogamia ou a poligamia como a forma ideal de casamento
contam com diversos tipos de megainibições como aliadas para tentar impor esses
ideais. Essas inibições também têm origem na nossa biologia, nas normas sociais
e em nossas idiossincrasias.
Neste
artigo vamos examinar as nossas tendências para o poliamor, para o polissexo e
as megainibições contra essas duas propensões.
Sentir atração
amorosa e sexual por várias pessoas é a regra
Responda
agora a seguinte pergunta: “Quantas pessoas existem no seu círculo de
relacionamento pelas quais você sente atração que, no mínimo, seria suficiente
para iniciar um relacionamento amoroso ou sexual?” (Desconsidere o fato de você
ou dessas pessoas serem comprometidos).
Possíveis respostas
-
Você respondeu que sente atração por uma, duas, três ou quatro pessoas? Não se
assuste: essas são as respostas mais comuns.
-
Você respondeu que não sente atração por ninguém? Este tipo de resposta é mais
raro. Geralmente ela é apresentada por quem foi ferido ou decepcionado
recentemente por um parceiro amoroso ou teve pais frios e distantes.
-
Você sente atração por mais que cinco pessoas? Geralmente quem apresenta esse
tipo de resposta se enquadra em uma ou mais das seguintes possibilidades: (1)
tem um estilo de amor Ludos (tem grande prazer na conquista, mas depois que ela
acontece, o interesse pelo parceiro diminui muito); (2) tem um alto grau de
erotofilia (gosta muito de sexo); (3) é polissexual (gosta de sexo com
diferentes pessoas) (4) é poliamoroso (é capaz de amar várias pessoas
simultaneamente) ou (5) frequenta locais onde existe muita gente atraente.
Apresentei
essa pergunta para diversos homens e mulheres em diferentes ocasiões. De uma
forma geral, quase todo mundo sente atração romântica e/ou sexual por mais que
uma pessoa. O fato de estar ou não comprometido afeta pouco as respostas (o
comprometimento diminui ligeiramente a quantidade de pessoas atraentes).
Conclusão:
todos nós, comprometidos ou não, sentimos atração por mais que uma pessoa, em
uma intensidade que, no mínimo, seria suficiente para começar um relacionamento
amoroso. Esse é um dos fatores que induzem à traição: quando nos comprometemos
com uma pessoa não deixamos de sentir atração por outras.
Origens do poliamor
e da polissexualidade
A
biologia, a sociedade e as nossas experiências idiossincráticas contribuíram
tanto para criar os atrativos amorosos e sexuais quanto para nos tornarmos
sensíveis a eles, quando são exibidos por outras pessoas. Aliás, esses mecanismos
são interdependentes: algo só é atrativo porque alguém que se atrai por ele.
Quase
todos nós nos deparamos frequentemente com pessoas atraentes na área romântica
e/ou sexual. Essas pessoas atraentes possuem alto grau de feminilidade ou
masculinidade, sensualidade, charme e beleza. O comprometimento não nos torna
cegos, surdos e anósmicos para a beleza, charme, vozes e odores dessas pessoas.
O comprometimento é uma forma de inibição que nos leva a tomar medidas para que
essas atrações não nos conduzam a um maior envolvimento com essas pessoas.
Muitos de nós somos poliamorosos
Quase
todo mundo já amou mais que uma vez na vida e teve várias paixões. Uma enquete
que realizei com estudantes universitários verificou que os participantes
tiveram 3,6 paixões e 1,3 amores (a idade média desses estudantes era,
aproximadamente, 24 anos). Em geral as pessoas se apaixonam ou amam diversas
pessoas sucessivamente. O mais raro é ter várias paixões ou amores simultâneos.
Aqueles cujos amores acontecem simultânea e corriqueiramente são chamados de
“poliamorosos”.
Todos
nós sentimos atração romântica por diversas pessoas simultaneamente. No entanto
não nos permitimos, e não nos é permitido, que essas atrações sejam
desenvolvidas a tal ponto ou de tal forma que elas se transformem em
relacionamentos amorosos paralelos. Essa capacidade para sentir atração
amorosa e sexual por diversas pessoas varia muito: para algumas pessoas ela é
bem pequena e para outras, imensa. A maioria fica entre esses dois extremos.
Algumas
pessoas são capazes de apresentar sentimentos amorosos profundos por vários
parceiros ao mesmo tempo. Essas pessoas sentem que cada um deles tem os seus
atrativos e seus defeitos e não se sentiriam satisfeitas se desenvolvessem um
relacionamento exclusivo com apenas uma deles.
A
poliamorosidade não necessariamente leva à traição. Muitos poliamorosos que
entrevistei não se comprometem exclusivamente com ninguém. Sempre deixam muito
claro como são neste setor, desde o inicio de seus relacionamentos.
O
poliamor difere do estilo Ludos de amar porque os lúdicos estão mais
interessados na conquista e, quando ela acontece, eles logo perdem o interesse
pelo parceiro. Os poliamorosos têm sentimentos duradouros pelos parceiros.
Os
poliamoros diferem dos polissexuais porque a base de seus relacionamentos é a
intimidade e o amor romântico e não o sexo. A base do relacionamento dos
polissexuais é o sexo, que pode acontecer até com desconhecidos ou em grupo.
Muitos de nós somos polissexuais
A
palavra "polissexual" é usada aqui para nomear aqueles que gostam de
praticar o sexo com vários parceiros, seja dentro de um casamento poligâmico ou
de uma forma pouco regulada como no sexo casual e no swing. A noção de que
nós, seres humanos, somos moderadamente polígamos já está amplamente difundida.
A notícia de que a maioria das sociedades estudadas pelos historiadores e
antropólogos tem a poligamia como forma ideal de casamento já é de conhecimento
público
As
sociedades como a nossa, que têm a monogamia como ideal, na prática são
polissexuais já que nelas existem muitas traições. Além disso, as regras da
nossa sociedade não são muito rígidas e, por isso, muitas pessoas manifestam
mais abertamente suas polissexualidades. Essas pessoas são aquelas que
frequentam casas de swing, têm casamentos aberto ou praticam sexo casual. A
maioria dessas pessoas guarda segredo sobre essas atividades para não sofrerem
sanções.
Muitos
polissexuais gays encontraram condições muito propicias para manifestar essa
preferência, pois eles têm mais facilidades para iniciar relacionamentos
sexuais do que os heterossexuais polissexuais.Isso acontece porque as
exigências masculinas, tanto entre os homos quanto entre os heterossexuais
masculinos, são bem mais reduzidas do as das mulheres para esta finalidade. Só
para ter uma ideia de como é bem mais fácil iniciar um relacionamento sexual
entre dois homens do que entre um homem e uma mulher, considere as seguintes
estatísticas americanas:
-
17% dos homens e 10% das mulheres heterossexuais relataram que tiveram dois ou
mais parceiros sexuais no ano passado.
-
28% dos homens homossexuais tiveram mais de 1000 parceiros. 83% dos homens
homossexuais entrevistados estimam que tenham feito sexo com 50 ou mais
parceiros nas suas vidas. 43% estimam que fizeram sexo com 500 ou mais
parceiros; 28% com 1.000 ou mais parceiros (Bell e Weinberg p 3081)
Somos megainibidos
A
inibição é o impedimento para realizar algo que estamos motivados para fazer.
Uma evidência da megainibição para manifestar nossas tendências poliamorosas e
polissexuais é o fato de que nunca houve uma sociedade onde tais expressões
tenham ocorrido livremente. Também sentimos medo, culpa e vergonha quando
começamos a pensar e a agir de uma forma "poli": já introjetamos os
valores sociais.
Inibições contra o poliamor
O
poliamor não é realizado por muita gente devido às consequências sociais que
esse tipo de opção acarreta: pouca gente aceitaria ter um relacionamento
profundo e comprometido com alguém que tem um relacionamento assim com varias
pessoas. Além disso, o poliamoroso acaba sendo estigmatizado e punido
pelas outras pessoas.
A
nossa sociedade condena o poliamor plenamente assumido, mas permite
usufruir um pouco desse tipo de relacionamento quando ele vem disfarçado
de amizade, coleguismo ou atividades profissionais.
Inibições contra o polissexo
Não
existe nenhum relato histórico ou antropológico de uma sociedade onde o sexo
era praticado livremente. Pelo contrário, todas as sociedades regulam a prática
sexual através de regras bastante rígidas. Até as tentativas artificiais
para criar comunidades onde o sexo e o amor eram livres não duraram muito
tempo. Uma dessas tentativas que mais durou foi a comunidade de Oneida, nos
EUA: durou cerca de 30 anos.
A
nossa sociedade está cada vez mais liberada. Por isso, cada vez mais pessoas
têm oportunidade de expressarem como realmente são e aquilo que as satisfazem
nas áreas amorosas e sexuais. Que cada um aja da forma que acredita, contanto,
é claro, que isso não traga danos para si ou para terceiros.
NOTA: 1- Bell, A. P. and
Weinberg, M.W (1978), “Homosexualities: A Study of Diversity Among Men and
Women”.New York: Simon and Shuster.
SE
VOCÊ É POLIAMOROSA OU POLISSEXUAL E QUER SER ENTREVISTADA, ESCREVA PARA O MEU
E-MAIL: ailtonamelio@uol.com.br
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