sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Cerca de 80% dos agressores sexuais contra crianças não são pedófilos



Cerca de 80% dos agressores sexuais contra crianças não são pedófilos



Estudos no Brasil e no mundo indicam que a maioria dos agressores sexuais contra crianças não são pedófilos. Pesquisa nacional realizada com sentenciados por crimes sexuais violentos no Estado de São Paulo identificou que somente 20% dos molestadores de crianças condenados preenchiam critérios diagnósticos para o quadro psiquiátrico de pedofilia. Entre agressores sexuais de adolescentes, o número é ainda menor: apenas 5%.

"Nem todo molestador de crianças é pedófilo. Da mesma forma, nem todo portador de pedofilia é molestador de crianças", afirma o professor de Psiquiatria e coordenador do Ambulatório de Transtornos da Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC (ABSex), Danilo Baltieri, que exemplifica. "Os índices verificados no estudo paulista são semelhantes aos encontradas em outros trabalhos ao redor do mundo. Boa parte dos indivíduos que abusam sexualmente de crianças são criminosos oportunistas. Selecionam os menores para o ato sexual simplesmente porque estão disponíveis em determinado momento e situação. Por outro lado, o indivíduo com diagnóstico médico de pedofilia pode manifestar fantasias sexuais intensas e recorrentes envolvendo crianças e púberes, mas jamais concretizá-las".

Segundo o Instituto WCF-Brasil (World Childhood Foundation), a pedofilia é a forma de violência sexual caracterizada pelo desvio da sexualidade que leva o adulto a se sentir sexualmente atraído de modo compulsivo por crianças e adolescentes. Trata-se de transtorno psiquiátrico de difícil diagnóstico e tratamento. De acordo com o Ministério Público Federal, a pedofilia em si não é crime. No entanto, o código penal considera crime a relação sexual ou ato libidinoso (todo ato de satisfação do desejo ou apetite sexual da pessoa) praticado por adulto com criança ou adolescente menor de 14 anos. Conforme o artigo 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é considerado crime, inclusive, o ato de "adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente".

Atitude preventiva
Apesar de muitos pedófilos não concretizarem as fantasias, existem fatores psicossociais apontados como facilitadores para o crime. Entre os principais estão doenças afetivas como a depressão, estresse psicológico intenso e abuso de substâncias psicoativas como o álcool. Quando algum desses fatores ocorre em meio à situação em que o indivíduo com pedofilia tem acesso às crianças, o comportamento pedofílico torna-se iminente.

Prisão e tratamento médico
Apesar de a maioria dos agressores sexuais de crianças e adolescentes não se enquadrar no diagnóstico médico da pedofilia, existe proporção variável de molestadores que realmente sofre de algum tipo de transtorno psiquiátrico. As desordens mentais mais observadas nessa população são problemas com álcool e outras drogas, impulso sexual excessivo, transtornos da preferência sexual, de personalidade ou de humor, além das parafilias - que são desejos ou atitudes sexuais anormais, como a própria pedofilia.

Entre agressores sexuais de crianças, os transtornos psiquiátricos isolados muitas vezes não provocam a substituição da pena judicial por medida de segurança. "Isso ocorre porque os transtornos raramente perturbam a capacidade do agressor de entender o caráter criminoso do fato, embora muitas vezes possam perturbar em algum grau a capacidade de decisão diante do mesmo", explica Danilo Baltieri.

Apesar de defender o tratamento especializado, o coordenador do ABSex ressalta que não é contra a pena em regime fechado para molestadores sexuais: "Nenhum especialista no tratamento de agressores sexuais ao redor do mundo é contra a pena de prisão para agressores sexuais de crianças ou de adultos. Somos contra a falta de avaliação adequada daqueles que praticaram o ato ilícito e contra a falta de tratamento adequado dentro e fora das prisões".

Para o psiquiatra, o manejo legal dos ofensores sexuais deve ser fundamentado e cientificamente embasado a fim de promover a justiça. "A pedofilia é exemplo claro de transtorno psiquiátrico de difícil diagnóstico e tratamento. Apesar disso, uma parcela significativa dos que padecem da doença responde bem ao tratamento médico e psicológico quando aplicado de forma adequada. Dessa forma, apesar dos estigmas que cercam a doença, o tratamento é um direito humano básico, que deve ser respeitado e instalado".

Entre os diversos fatores relacionados à reincidência criminal para agressores sexuais, ser portador de pedofilia é um dos mais significativos. Por essa razão a sanção penal desvinculada do tratamento não suprime as necessidades do preso portador da doença e tampouco promove a reinserção social.

O tratamento é psiquiátrico - com utilização de psicoterapia -, psicoeducacional e à base de medicações. Também há terapia em grupo para orientação e educação sexual. Os pacientes são avaliados individualmente e, de acordo com critérios específicos, são incluídos em grupos, cuja duração varia entre 16 e 20 semanas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário