Atraso do
"Viagra para mulheres" prova machismo da comunidade científica
O medicamento Addyi, popularmente chamado de "Viagra
feminino", chega ao mercado prometendo tratar a falta de libido das
mulheres.
Por Daniella Franco
Com pouca eficácia comprovada, uma série de efeitos colaterais e um
atraso de 17 anos em relação ao Viagra, o Addyi, medicamento que promete
aumentar o desejo sexual das mulheres, foi aprovado nos Estados Unidos. Para
muitos especialistas, essa demora em tratar um problema comum entre as mulheres
reflete o viés misógino da pesquisa e da indústria farmacêutica, que se
concentram há décadas apenas nos problemas sexuais masculinos.
Na semana passada, a flibanserina se tornou a primeira substância para
disfunções sexuais femininas a ser validada pela FDA, agência norte-americana
reguladora de medicamentos e alimentos. A aprovação, depois de duas rejeições
consecutivas, reabriu o debate sobre a importância da sexualidade feminina e o
mostrou o quanto a questão ainda é ignorada não só pela sociedade como também
pela comunidade científica. Vários grupos feministas acusam a FDA de demora na
validação do medicamento para as mulheres, enquanto vários produtos para
melhorar a perfomance sexual dos homens foram aprovados facilmente.
Outras polêmicas chegam antes mesmo de o Addyi começar a ser comercializado,
como a série de efeitos colaterais do produto, como desmaios, diminuição da
pressão arterial, náuseas e sonolência. A eficácia do remédio também é
contestada: testado em 2.400 mulheres com uma idade média de 36 anos, apenas
10% dizem ter percebido uma melhora em seu prazer sexual. Outro teste também
mostrou que mulheres que tomaram o medicamento tiveram 4,4 experiências sexuais
satisfatórias em um mês contra 3,7 relações sexuais prazerosas apontadas por
pacientes que estavam ingerindo placebo.
Para o ginecologista francês Sylvain Mimoun, a percentagem de eficácia
não diminui a importância da aprovação do produto. "Mesmo que o Addyi não
seja uma revolução, ele representa um grande avanço para muitas mulheres que
enfrentam problemas sexuais e que esperavam há anos um medicamento como esse.
Claro, não podemos esperar que ele tenha uma eficácia de 80% ou 90%, mas mesmo
que os primeiros resultados sejam baixos, o mais importante é que ele pode
ajudar muitas pessoas", ressalta.
Como funciona
Produzida pelo grupo norte-americano Sprout Pharmaceuticals, a
flibanserina é destinada à mulheres na pré-menopausa que sofrem com a falta de
desejo sexual que não esteja relacionada a uma disfunção física ou hormonal. A
FDA aprovou o Addyi especificamente para uma condição conhecida como distúrbio
de desejo sexual hipoativo generalizado adquirido (HSDD na sigla em inglês).
O medicamento atua como antidepressivo no sistema nervoso central e
modifica a concentração de alguns neurotransmissores, explica a psicóloga especialista
em educação sexual, Carolina Freitas. "Ele age diretamente em três
substâncias que temos no cérebro, essenciais para o bem-estar e o desejo
sexual, promovendo o aumento da dopamina, da norepinefrina e a diminuição da
serotonina. Essas transformações ajudariam a despertar o desejo sexual",
diz.
O psiquiatra e sexólogo francês Gérard Tixier lembra que o Addyi não
pode ser comparado ao Viagra, que trata a disfunção erétil masculina.
"Para que o Viagra tenha efeito, é necessário que o desejo sexual exista.
A flibanserina trata a falta de libido, que é um problema sério para muitas
mulheres. Então, se esse antidepressivo pode ajudá-las a acordar seu desejo
sexual, a chegada do Addyi é muito positiva", avalia.
Além do que se vê
Carolina Freitas ressalta que o Addyi trouxe de volta o debate sobre a
sexualidade feminina, mas não acredita que o medicamento sozinho possa resolver
todos os problemas relacionados à falta de desejo sexual das mulheres. "A
libido feminina engloba muitas particularidades. As mulheres são mais
emocionais. Então, além da questão física, é preciso considerar o envolvimento,
o bem-estar e a própria vontade das mulheres. Ou seja, apenas a medicação não
vai resolver completamente o problema", ressalta.
Para a psicóloga, a permissão própria da mulher de ter prazer é
essencial para um vida sexual saudável. "Afinal, mesmo nas sociedades mais
modernas, muitas mulheres não têm permissão de ter libido. Então, receio que
essa medicação seja mais uma ‘permissão externa’, como se a mulher não pudesse
nunca ser responsável por seu desejo sexual", reitera.
Tratamento regular
A Sprout Pharmaceuticals alerta que o Addyi começa a ter efeito
após algumas semanas de utilização e que o tratamento precisa ser regular. Ele
poderá ser adquirido apenas com receita médica e não pode ser utilizado por
mulheres que ingerem bebidas alcoólicas.
O Addyi chega às farmácias dos Estados Unidos no próximo mês de outubro.
No Brasil, o medicamento ainda está sendo analisado pela Anvisa, a Agência
Nacional de Vigilância Sanitária, e não tem previsão para começar a ser
comercializado. Já na França, especialistas acreditam que o remédio estará
disponível aos consumidores dentro de um ano.
Texto publicado originalmente em RFI Brasil
Os verdadeiros efeitos da pílula rosa
para o desejo feminino
Carolina Freitas, Psicóloga, Sexóloga,
especialista em Educação Sexual,
Mestre em Psicologia - 31/08/2015
Acaba de ser autorizado a comercialização do
remédio que promete aumentar o desejo sexual feminino. Também chamado
(erradamente) de "viagra feminino", o Addyi atua de forma diferente
do Viagra. Veja abaixo como ele age no organismo.
Link para assistir ao Vídeo
Com a aprovação do “viagra feminino”, vemos
entrar em discussão, mais uma vez, algumas questões sobre a sexualidade
feminina. Vamos então entender o Addyi, também conhecido como a pílula rosa.
Como ela age no organismo?
O “viagra feminino” atua na primeira fase do
ciclo da resposta sexual humana, o desejo. A medicação altera a química do
cérebro. De maneira simples, “mexe” nas substâncias químicas essenciais do
cérebro, aumenta a dopamina e a norepinefrina e diminui a serotonina, com a
finalidade de despertar a libido, o desejo sexual. Seu uso deve ser diário.
Já o “viagra masculino” atua na segunda fase do
ciclo da resposta sexual humana, a excitação. A medicação altera o fluxo
sanguíneo nos órgãos genitais, com a finalidade de ter e manter a ereção. Seu
uso é situacional.
De que "é feito" o
Desejo Sexual feminino?
Como estamos então falando em desejo é
importante deixar claro que desejo sexual não é apenas feito de substâncias,
não é genital exclusivamente. Ele é subjetivo, inclui sensações, emoções,
relacionamentos, interações e motivação.
O bom disso tudo é a visibilidade dada à
sexualidade feminina, principalmente ao desejo sexual feminino. Pois, de nada
adianta pensar em prazer, em orgasmo se não tiver o desejo. E sim, tem como
ajudar a mulher (e o homem também) a desenvolver seu desejo sexual, se quiser.
O receio é mais uma vez a mulher colocar a sua
vida sexual nas mãos de terceiros – do homem, da taça de vinho, do chopp, da
medicação. Mulher, a responsabilidade pelo seu desejo sexual é sua!
Como aumentar o desejo
feminino?
Para tanto, permita-se ser um ser sexual. Saiba
que o sexo faz parte da vida. É prazer, é comunicação. Quer se sentir mais
segura e mais confiante e confortável com a sua vida sexual, busque sua
autonomia e seu bem-estar. Se a medicação for realmente necessária ela será bem
vinda e prescrita.
Por fim, o tratamento da disfunção do desejo
sexual, bem como de qualquer outra disfunção sexual, não se resume à medicação.
Existem estratégias de tratamento, que são individuais, que te ajudarão a ter
uma vida sexual saudável.
Carolina Freitas
Psicóloga Especialista em Educação Sexual CRP
09/8329
Texto publicado originalmente em Sexo sem Dúvida
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